quinta-feira, 18 de junho de 2009

Explicativo sobre o "Alerta ao Brasil"

Dia 11 deste mês, na postagem "Um alerta ao Brasil: RE 461366", o blog recebeu uma linguagem um pouco mais técnica, em termos jurídicos, e diversos emails foram enviados pedindo esclarecimentos sobre a essência do alerta, que, ao que tudo indica, não ficou muito clara.

Na verdade, o alerta é composto de três signficados específicos, diante da prática da institcionalização da violação do sigilo bancário dos cidadãos: a) o cometimento de diversos crimes por Agentes Públicos; b) a nulidade de todos os processos que tenham seu início em tal prática; e c) os efeitos da fragilização da Ordem Pública que tal prática enseja.

Tais temas merecem, no entanto, postagens específicas que, na medida do possível, vão sendo colocadas no blog.

Saudações, João

Jornalismo: uma expressão de liberdade

Todos os noticiários de hoje fazem menção ao julgamento de ontem do STF no qual ficou decidido ser inconstitucional a exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista (Push STF, UOL, Conjur, G1, Folha).

Aparentemente a sociedade brasileira, por sua mais alta Corte, manifesta uma grande contradição ao permitir a informalidade do exercício profissional, em meio a um movimento de formalização máxima, que vem sendo instalado ao longo de muitas décadas.

Mas numa visão mais abrangente da realidade, pode-se dizer que o Brasil deu um passo gigante em direção à implementação da essência do conteúdo constitucional, ao tirar a possibilidade de trabalho de uma classe e passar seu poder (de opção, de oportunidade e de trabalho) às mãos do cidadão.

Prestigiou-se o Princípio do Trabalho e da Livre Iniciativa (inciso IV, do artigo 1º, CF) em detrimento da feudalização da oportunidade profissional.

Saudações, João


quinta-feira, 11 de junho de 2009

Um alerta ao Brasil: RE 461366

A Primeira Turma do STF decidiu, no Recurso Extraordinário nº 461366, com trânsito em julgado em 30.09.2008, que o Banco Central não pode violar o sigilo bancário do cidadão (Push STF, Clipping AASP, Migalhas nº 1711), trazendo entendimento diverso de prática que vem sendo levada a efeito pelas autoridades financeiras do país, principalmente a Receita Federal, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o próprio Bacen, desde a edição da Lei nº 9.613/98 (Lei de Lavagem de Dinheiro e criação do COAF - Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

A ementa da decisão diz: "SIGILO DE DADOS – ATUAÇÃO FISCALIZADORA DO BANCO CENTRAL – AFASTAMENTO – INVIABILIDADE. A atuação fiscalizadora do Banco Central do Brasil não encerra a possibilidade de, no campo administrativo, alcançar dados bancários de correntistas, afastando o sigilo previsto no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal."

A se considerar o teor da Lei nº 9.613/98, todos os resultados da ação fiscalizadora do COAF se dão no campo administrativo e tem por escopo a ciência, pelo Poder Executivo, dos dados bancários sigilosos do cidadão, o que enseja a imprestabilidade de todas as informações daí decorrentes, enquanto elementos de formação de conjunto probatório, para efeito processual ou enquanto elementos ensejadores da ação do Poder Público contra o cidadão, em decorrência do disposto o inciso LVI do artigo 5º da CF, vez que a previsão legal diz que é vedada no processo a prova obtida por meio ilícito, o que se configura pela violação aos incisos X e XII do mesmo artigo da Constituição, na medida em que é ausente a ação do Poder Judiciário e, portanto, inexistente a expressão das garantias individuais constitucionais ao cidadão.

Ora, ainda que se tenha em mente que esta atividade busca a coleta de indícios de atividade ilícita, sua prática significa infração à vedação da violação de sigilo bancário trazida no artigo 38 Lei nº 4595/64, que, pelo teor da decisão ora analisada, não foi revogada pela Lei Complementar nº 105/2001, posto que a Corte Constitucional dá indícios de que a tentativa de, na prática, obter sua revogação, a final, deve se mostrar como desastroso movimento da máquina administrativa, que segue em rota de colisão aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito alcançado pelo Brasil - diga-se, a tão alto custo - e que, apesar de sua recusa pela classe dirigente, são legítimos e inafastáveis para a manutenção da Ordem Pública.

Ao rechaçar a possibilidade de cognição de dados bancários sigilosos, em sede de procedimento administrativo, a Primeira Turma do STF dá claros sinais de que o entendimento da Corte Suprema é pela preservação da ordem estabelecida pela Constituição Federal em 1988, mostrando-se o movimento do Executivo, iniciado pela edição e prática do conteúdo da Lei nº 9.613/98, absolutamente temerário a todos os Agentes Públicos que o praticaram, em função da restrição à essa corriqueira violação de sigilo bancário, que é coisa muito diferente da quebra de sigilo bancário judicialmente decretada.

A ciência da intimidade do cidadão pelo Poder Público, sem o devido processo legal, sem a possibilidade da ampla defesa e do direito ao contraditório, significa a violação da essência da Constituição Federal que tem por princípio inicial a cidadania. Tudo no Brasil Democrático vem depois, e tem menos importância, que a cidadania, que é garantida por um sistema que tem por base fundamental as garantias individuais trazidas no artigo 5º, sua aplicabilidade tratada em seu parágrafo 1º, sendo o dever de ofício de sua guarda pelos agentes públicos imposto pelo inciso I, do artigo 23.

Após a garantia da soberania nacional, tratada no inciso I, do artigo 1º, vem a cidadania no inciso II, deixando inequívoco no sistema, pela aplicação do Princípio da Organicidade da Lei, que todo e qualquer movimento do Poder Público, que tenha seu início ou sua finalidade no desrespeito aos direitos e garantias individuais, vai contra a essência da Constituição. Se, por um lado, os direitos e garantias individuais não têm um caráter absoluto, por outro, a exceção somente pode se verificar pela atividade da totalidade do Estado, posto que a nenhum agente público, isoladamente, é dado fazer prevalecer o interesse público sobre o particular, segundo seu próprio entendimento ou iniciativa isolada, sendo tal mister somente alcançado pelo exaurimento da atividade estatal, que se dá pela atuação do Poder Judiciário.

Vale dizer que para que haja qualquer exceção nos Direitos e Garantias Individuais, elencados na Constituição Federal, é necessário que, além da previsão legal trazida pela ação do Poder Legislativo e da iniciativa do Poder Executivo, haja ainda o controle da atividade do Governo, pelo próprio Estado, nas mãos do Poder Judiciário, na forma expressa pelo Direito Processual. Isto porque a própria Constituição expressa que o Poder do Estado não é de titularidade do Agente Público, mas sim do cidadão. O Agente Público exerce o poder estatal por mandado eletivo, quer pelo voto direto ou por concurso, colocando-se, com relação ao cidadão, na posição de seu mandatário, sendo que aquele que age em nome do titular não tem conexão mais próxima do objeto do mandato que o próprio titular, podendo ser alijado de sua função pelo simples exercício do poder principal ou originário, conforme a expressão do parágrafo 1º, do artigo 1º, da Carta Magna, que não deixa qualquer margem à dúvida nesse sentido.

Diante de tal situação é uma questão de tempo (e oportunidade processual) até que nova realidade, a da expressão da verdade constitucional, comece a surgir no cenário nacional, no quotidiano do cidadão, não sem deixar profundas marcas advindas dos erros sucessivos dos Governos que imprudentemente - e ilegalmente - têm se assenhoreado da titularidade da vida do cidadão, e de seus empreendimentos sociais, ao penetrar ilicitamente em sua intimidade financeira, aparentemente, sob o velho jugo da "sanha arrecadatória dos publicanos".

Se, por um lado, é desejável e saudável para o Estado Democrático de Direito que se tenha um Estado forte e atuante, por outro, a desmedida do poder estatal nas mãos do Governo causa indesejáveis e desastrosos efeitos, mormente pela margem que dá aos abusos e desvios que sempre acabam por se verificar. Dizia um velho professor que "o Governo está para o corpo social assim como as sobrancelhas estão para o corpo físico, a servir como reguladores da luz para a visão apropriada da realidade, que, se crescidas em demasia, embotam a visão, fazendo-se perder o rumo, sendo inevitáveis o tropeço e o tombo". E somente pela ação eficaz do Sistema Judiciário se pode ter uma regulação do poder estatal, presente nas mãos do Governo.

Saudações, João